Os dias do fim
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Bastante interessante o editorial de hoje do jornal O Estado de S. Paulo, o secular "Estadão", sobre os malabarismos, as safadezas, os protecionismos que estão sendo utilizados para prolongar na UTI a vida que se esvai da defunta Varig. O título é, de cara, uma ironia...
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Tenho acompanhado, curiosíssimo, a comédia de desacertos, malandragens e mentiras acerca da defunta. O leilão, "micado" segundo um grande jornal em sua edição de hoje, chegou a ser antecipado, bandidos de todas as partes se anunciaram promitentes compradores e, também, vários grupos já declararam seu desinteresse e os que compraram o data-room com as informações que expõe as vísceras da falecida, o fizeram por um simples motivo: o acesso às informações confidenciais que contém. Nada ético, convenhamos, mas válido no capitalismo.
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Agora que os Napoleões do manche e as bandeijeras enfurecidas já nem me escrevem espinafrando-me, a fatura está prestes a ser liquidada. É paradigmático, é necessário, é importante para o país que a safadeza empresarial, a má gestão e o péssimo hábito de se mamar nas tetas do Erário sofram um golpe mortal e uma lição didática com o fim de uma empresa decadente, prebendária e inviável. O mercado já se encarregou de ir suprindo as lacunas que seu fracasso foi abrindo e sua morte quase nenhum transtorno causará. O Brasil tem muito a aprender com a quebra da defunta e a observar com a maneira indolor com que será substituída, pouco a pouco, pelas atuais e pelas novas empresas aéreas que surgirão. A morte da Varig é uma excelente notícia para o Brasil.
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"O milagre da Varig
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O governo, os funcionários, os consultores contratados, o juiz que preside o processo de recuperação judicial e a diretoria da Varig estão fazendo verdadeiros malabarismos para manter a empresa funcionando. Não é por falta de esquemas engenhosos e grandiosos que a Varig não sai do buraco onde foi metida por muitos anos de gestão ruinosa. Nos últimos tempos, não se passa uma semana sem que surja uma fórmula milagrosa de recuperação, apoiada em avaliações que "provam" que a empresa não apenas é viável como pode recuperar, em prazo curto, a participação majoritária que teve na indústria brasileira do transporte aéreo.Algumas semanas atrás, o governo autorizou o BNDES a estender a mão à Varig. Nos primeiros dias do governo Lula, o Palácio do Planalto fazia saber que a Varig levava o bom nome do Brasil para o Exterior e, no que dependesse das autoridades, a empresa não seria derrotada por passageiras dificuldades financeiras. Não demorou muito para que as autoridades, percebendo a real situação, passassem a advogar uma "solução de mercado" para a crise.Com a proximidade das eleições e tendo os funcionários da empresa promovido ruidosas manifestações de rua e no Congresso, o governo reviu sua posição, oferecendo ajuda do BNDES. Mas a oferta foi sibilina. O BNDES colocou US$ 166,6 milhões - número cabalístico cujo significado só os iniciados conhecem - à disposição, não da Varig, mas de outras empresas que se dispusessem a tomar o empréstimo-ponte e repassá-lo à companhia aérea. Implicitamente, o BNDES não reconhecia a idoneidade da Varig como tomadora de crédito - o óbvio numa empresa que tem um passivo reconhecido em juízo de RS$ 7,9 bilhões, quase todo a descoberto. As três empresas que se candidataram não ofereceram garantias e, assim, o empréstimo-ponte não foi concedido.A ajuda real para que a empresa, atolada em dívidas e sem capital de giro, pudesse continuar funcionando veio do juiz Luiz Roberto Ayoub, da 8ª Vara Empresarial do Rio de Janeiro, onde tramita o processo de recuperação judicial da Varig. Por meio de decisão liminar, ele determinou à BR Distribuidora que forneça à Varig combustível a crédito. Trata-se de decisão rara nos anais da Justiça, pois obriga um fornecedor a tomar calote que supera os RS$ 70 milhões e cresce diariamente, sob pena de desobediência à ordem judicial.Há outras coisas estranhas, na tentativa de recuperar a empresa. Por exemplo, decidiu-se vender parte da Varig, em leilão, por US$ 860 milhões, se o comprador quiser as rotas nacionais e internacionais, livres de dívidas; ou por US$ 700 milhões, só com as rotas nacionais e igualmente sem ônus. Não está à venda a "parte comercial" da empresa, o que inclui o programa de milhagem, a área de marketing e os balcões de vendas de passagens. Essa parte continuará em recuperação judicial, assumindo todas as dívidas, amortizadas pelo valor arrecadado no leilão. O restante será pago com a receita que a "parte comercial" produzir. Não é fórmula para qualquer mortal compreender, mesmo porque qualquer um que disponha de US$ 700 milhões, ou US$ 860 milhões, poderia montar uma empresa aérea nova, sem a herança da falência e de maior porte do que o que restou da Varig. Além disso, o comprador dificilmente se livrará de uma enxurrada de processos de credores da Varig, que não se conformarão em ver seus créditos jogados numa "empresa" pouco capaz de gerar receita.Só se entende a arquitetura desse negócio quando se fica sabendo que o edital do leilão dispensa a pré-qualificação dos eventuais compradores e acelera o processo de capitalização da parte a ser leiloada. Para isso, o comprador terá de fazer um depósito de US$ 75 milhões três dias após o leilão. Se a Justiça e a Agência Nacional de Aviação Civil não concluírem em 30 dias a análise do contrato, o comprador terá de depositar mais US$ 50 milhões. Esses adiantamentos cobririam as despesas correntes mais urgentes da Varig, constituindo capital de giro.O leilão foi antecipado de 9 de julho para 5 de junho. Quando isso aconteceu, as ações da Varig tiveram uma alta de 98,5% na Bolsa. Fazem-se verdadeiros milagres para manter a Varig voando, mesmo que ela não tenha condições financeiras para funcionar. "
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