Tuesday, June 06, 2006

A toga do anjo
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O juiz da 8ª Vara Empresarial do Rio de Janeiro, o Dr. Ayoub, que conduz o processo envolvendo o leilão da defunta Varig, segundo a Folha de S. Paulo de hoje, se autodenominou "anjo da guarda da Varig". Disse que não troca as suas 130 mil milhas no programa Smiles, que valem viagens aos EUA e à Europa, por "acreditar na viabilidade da empresa". Disse, também, o anjo de toga, que a defunta "trás R$ 1 bilhão de dólares de divisas para o país todos os anos" (sic). Disse tanta coisa o Dr. Ayoub...
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Num país mais sério o Dr. Ayoub não estaria fazendo as coisas que faz, falando as coisas que fala ou se acreditando um expert nos místeres de um assunto tão complexo, especializado e intríncado como a aviação comercial. Nem, quem sabe, cometendo o ledo ivo engano de se acreditar um iluminado que pode salvar a marafona dos ares depois de décadas de gestões ruinosas. Seria um crime colocar no mesmo cockpit um homem honrado como o Dr. Ayoub e os ladravazes que mataram a falecida. Cabe ao magistrado encomendar a alma, não se acreditar um bruxo que pode ressuscitá-la. É lamentável. Mas, anotem aí: isso não vai acabar bem. O Dr. Ayoub precisa ser brecado, imediatamente. Ele está, claramente, exorbitando de suas funções. Não acredito que pelo fato de ter milhas no programa de fidelização da defunta, paire sobre o magistrado qualquer suspeição. Em absoluto, ele é um homem honrado. Mas conceder uma liminar obrigando que a BR Distribuidora entregue combustível à uma empresa quebrada e inviável sem receber o necessário pagamento, é um escárnio, um desrespeito aos contribuintes, uma ofensa a todos nós.
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O Dr. Ayoub, perguntado sobre o provável e anunciado fracasso do leilão da defunta, disse o seguinte: "Se ninguém arrematar, o processo vai para outra fase, que eu vou decidir qual é." Ora, se não aparecer um comprador (um doido ou aventureiro, é óbvio), depois de terem até adiantado a data do leilão, fica claro o que sabem até os urúbus do lixão da Ilha do Governador, a poucos metros do hangar da defunta (onde estão parados mais de 20 aviões por falta de peças de reposição, por falta de crédito, por falta de ação da ANAC): nada mais há a ser feito. A festa acabou, a luz apagou, o povo sumiu, a noite esfriou. E agora, Ayoub?
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ruynogueira@uol.com.br