Friday, June 09, 2006

Toca o enterro, Ayoub!
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Depois do espetáculo patético onde um juiz de direito, exorbitando de suas funções, faz discurso político e é aplaudido de pé, com fervor xiita, por 1.300 funcionários de uma empresa quebrada - processo no qual eles, os mamadores, tem grande culpa - e só um "comprador" aparece, é hora de, como no trágico verso de Augusto dos Anjos, enterrar a última quimera. Chega! Basta! A incompetência, a desonestidade, a apropriação indébita das taxas da Infraero, o combustível tomado (por decisão inédita e do mesmo juiz) da Petrobrás (e que jamais será pago!), a manutenção precária e que poderá causar sérios incidentes (vejam como estou sendo elegante: in-ci-den-tes...), não podem mais ser tolerados.
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O obscuro TGV, que apresentou a pífia "proposta" no leilão da defunta, faz - segundo o Sindicato Nacional dos Aeronautas em seu site (www.aeronautas.org.br), "gangsterismo"! Está lá, eu lí! E é esse o comprador, o salvador, o grupo empresarial que vai salvar a moribunda marafona dos ares?
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Além do farto noticiário de toda a imprensa nacional, há o do "Correio Braziliense" (www.correioweb.com.br) com imperdível entrevista do presidente da Infraero, brigadeiro José CarlosPereira. Mais lúcido, impossível.
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AVIAÇÃO
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Varig é desacreditada
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Concorrentes desistem de oferecer lance pela companhia e a única proposta, de apenas US$ 449 milhões, coube aos trabalhadores da empresa. Analistas acreditam que o risco de falência ainda é muito alto
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Mariana Mazza, Da equipe do Correio
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O leilão de venda da Varig, ontem no Rio, atraiu muitos investidores, mas nenhum se interessou em adquirir a companhia
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A crença de que a Varig conseguiria se salvar por meio de uma solução de mercado caiu por terra ontem. O melancólico leilão da companhia atraiu investidores privados, especialmente concorrentes do setor. Mas, apenas como observadores. A única proposta partiu dos trabalhadores da empresa, representados pela NV Participações. A rejeição do setor em investir na recuperação da Varig praticamente selou as possibilidades de uma reversão da profunda crise financeira da companhia. A decisão se a aérea fechará as portas imediatamente ou se conseguirá uma sobrevida de alguns meses será conhecida apenas hoje. O juiz responsável pelo caso, Luiz Roberto Ayoub, pediu 24 horas para se pronunciar sobre a proposta da NV Participações, feita apenas na segunda rodada do leilão, onde eram permitidos lances abaixo do preço mínimo. Na primeira rodada, o piso para a venda da Varig era US$ 860 milhões. A oferta da NV foi de US$ 449 milhões, quase metade do preço mínimo, mas acima do valor vil da empresa, estipulado em US$ 420 milhões. O clima ontem era de ceticismo sobre a capacidade de a oferta restabelecer definitivamente as operações da aérea. A proposta eqüivale a R$ 1,010 bilhão, mas apenas R$ 285 milhões — menos de um quarto do total — será pago em dinheiro vivo. A maior parte da oferta, R$ 500 milhões, é respaldada em uma emissão futura de debêntures para participação nos lucros da nova companhia. Os demais R$ 225 milhões virão da renúncia de créditos trabalhistas que os funcionários têm a receber. De acordo com o último balanço divulgado pela aérea, em setembro de 2005, as dívidas com empresas privadas, estatais e funcionários estão na casa dos R$ 5,686 bilhões. Ou seja, apenas 5% do passivo seria quitado imediatamente com o pagamento em dinheiro, caso a proposta seja aceita. Para colocar a mão no restante da oferta, os credores terão que esperar mais um tempo. E, ainda assim, faltariam R$ 4,676 bilhões em dívidas que a NV não será obrigada a arcar, caso leve os ativos da Varig Operacional. Falência aguardada Gol, TAM, Ocean Air e um fundo de investimento chamado Céu Azul chegaram a se credenciar, mas desistiram da disputa. O presidente da Empresa Brasileira de Infra-Estrutura Aeroportuária (Infraero), brigadeiro José Carlos Pereira, acredita que tudo não passou de uma simples estratégia de mercado. A morte da Varig é mais vantajosa para as concorrentes do que a aquisição. O motivo é que, se a aérea falir, as cobiçadas rotas nacionais e internacionais voltam à União e qualquer companhia poderá pedir o horário de vôo à Agência Nacional de Aviação Civil (Anac). “Para que alguém iria investir na Varig podendo conseguir o que quer de graça?”, arremata o presidente da estatal. Após o leilão de apenas 20 minutos, o tom fúnebre se espalhou entre os envolvidos no setor. O presidente da Anac, Milton Zuanazzi, admitiu que a agência está pronta para aplicar um eventual plano de contingência, caso seja decretada a falência da Varig. Em Brasília, o ministro da Defesa, Waldir Pires, lamentou o desinteresse dos investidores e eximiu o governo de culpa pelo iminente fim da companhia. “Fizemos o que foi possível, dentro da lei, para que não faltassem os insumos básicos que permitissem que a Varig continuasse operando”, afirmou. Na contramão, o presidente da aérea, Marcelo Bottini, e o juiz Ayoub saíram otimistas. Bottini disse ter ficado “muito contente” com a aparição de um interessado. Ayoub, que a Varig é uma empresa viável, “com problemas de curtíssimo prazo”. Mas, ao final do dia, o mercado deu outra prova da descrença no futuro da aérea, que já foi a maior da América Latina. As ações da companhia caíram 58% no pregão da Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa), encerrando o dia cotadas a R$ 1,51. Enquanto isso, as ações da Gol e da TAM subiram 4,92% e 7%, respectivamente.
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Solução não cai do céu
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O final trágico do leilão da Varig, com apenas uma proposta feita pelos funcionários, podia ter sido evitado. Os vilões não foram as concorrentes, que desistiram da empreitada na última hora, ou o governo, que não ajudou a companhia. O cerne do problema está dentro da própria Varig, que não investiu de fato no seu processo de recuperação judicial, confiante de que alguma solução cairia do céu. São cinco anos de crise, um dentro da nova Lei de Falências. Tanto tempo se passou e pouquíssimo foi feito para evitar a derrocada da companhia. Apostou na nova da nova Lei de Falências e iniciou um processo de recuperação judicial em 2005. A opção foi boa. A condução, não. A Varig levou meses para criar um plano de recuperação. O texto foi aprovado apenas em dezembro de 2005 e jamais aplicado efetivamente. A aposta era que, quando todas as opções acabassem, ainda haveria algum investidor disposto a comprar a empresa. O sinal ontem foi claro: a Varig, agora, vale mais no chão. É inegável o valor da marca da aérea, mas nome não paga dívidas de R$ 6 bilhões. A Varig escorou-se na crença de que o governo não a deixaria falir. Errou. Apostou suas últimas fichas na idéia de que um investidor pagaria pelo nome da empresa. Errou de novo. A Varig se beneficiou mais de uma vez dos problemas de suas concorrentes. Agora, será a vez delas. (MM)
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Entrevista - brigadeiro José Carlos Pereira, presidente da Infraero
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Infraero sem esperanças
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Há poucos meses na presidência da Infraero, o brigadeiro José Carlos Pereira, não titubeia ao falar o que pensa sobre a crise da Varig. Acredita que não há mais salvação e que a Justiça não deve aprovar a proposta feita ontem. Também concorda com a postura das concorrentes, que apenas esperam a falência da empresa aérea. “Esse é o jogo do mercado.”
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Porque não surgiram investidores privados no leilão?
Para que uma pessoa vai gastar dinheiro com uma coisa que pode conseguir de graça? Se eles não fizerem nada, a Varig cai sozinha. E as linhas caem no seu colo de graça.
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A aprovação da proposta da NV Participações é suficiente para salvar a Varig?
Eu não acredito que ela seja aprovada. O dinheiro não é suficiente para tirar a Varig da crise. Serve apenas para dar uma sobrevida. Mas a agonia voltará logo em seguida.
De quanto tempo seria essa sobrevida?
A Varig não vai longe. Daqui há seis, sete meses ela entra em uma grande crise de novo.
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O senhor acredita que a Varig pagará a dívida com a Infraero?
A apropriação indébita da Varig das taxas de embarque já chega a R$ 27 milhões. Se eu receber isso, já me considero feliz. Porque a dívida corrente mesmo é de R$ 540 milhões. E sabe quando que a Varig vai me pagar? Nunca. Para nós da Infraero não tem muito nhenhenhe. Qualquer número acima de zero, já é vantagem. Existe alguma saída, caso o leilão fracasse? Para a Infraero, a única coisa que nos resta agora é rezar. Não há mais nada a fazer.
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