Pela limpeza do Supremo
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“Já que o mundo fez de mim uma prostituta,
irei transformar o mundo num grande bordel”
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Clara Zachanassian,
in “A visita da velha senhora”,
de Friederich Dürrenmatt
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Na primeira das quatro vezes em que visitei Lima, a cinzenta e úmida capital dos peruanos, avistei pela janela do hotel Sheraton um edifício imponente, do lado oposto do largo e caótico Paseo de la República. Uma construção antiga, imponente, bonita, lembrando um pouco o demolido Palácio Monroe, na Cinelândia, onde funcionou o Senado da República nos tempos do Rio Capital Federal. No táxi indaguei sobre o mastodonte. “És el palácio de la injusticia”, esclareceu-me o velho motorista, com traços indígenas, ar irônico e riso triste. Comecei a compreender ali, naquele preciso instante, a fabulosa popularidade que o ditador Alberto Fujimori gozava entre as camadas mais humildes da população. Meses antes, a suprema corte peruana havia passado por uma limpeza exemplar, com aposentadorias compulsórias, expulsões sumárias ou simples execrações de magistrados que se julgavam acima do bem e do mal. Os peruanos odiavam sua justiça. Os claros favorecimentos, as comentadas compras de sentenças, as negociatas quase públicas, as vendas de proteção, os engavetamentos ad aeternum, os escritórios de advocacia que garantiam as sentenças previamente compradas, os filhos que advogavam na corte onde os pais eram juízes, os ex-sócios e suas intimidades com as maçanetas dos gabinetes, os escandalosos acertos com o sistema financeiro, a adesão sistemática aos governos, a desenvoltura política dos juízes e o impressionante descrédito perante os peruanos formaram o grosso caldo de cultura que propiciou uma faxina geral no poder judiciário local. Esse mérito Fujimori tem: deu aos peruanos uma justiça na qual, ainda hoje, acreditam bem mais que antes.
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O gatuno Carlos Menem foi nomeando juízes para a Corte Suprema da Argentina à sua imagem e semelhança. Cada qual pior que o outro. Gente de quinta categoria. Lembro-me da imagem de um deles, um cáften típico, com direito a anelão, cabeleira pintada de um negro brilhoso, indecente, tipo asa da graúna, com cara de picareta, com jeito de picareta, com ademanes de picareta. Picareta, portanto. Nada na Argentina escandalizou tanto, chocou tanto, afrontou tanto quanto aqueles provectos picaretas que garantiram ao gatuno de La Rioja uma tranqüila maioria na última instância do judiciário local. E põe última nisso... Nestor Kirchner - homem corajoso e decidido, ao contrário de seu colega brasileiro – moveu campanha memorável contra os juízes menemistas. Os atacou publicamente pelas TVs, no Congresso, em discurso na Casa Rosada, citando os nomes, esculhambando-os de forma implacável. Não deu outra: alguns se aposentaram rapidinho, outros enfrentaram “juícios políticos” no parlamento, respondendo por seus crimes e sendo defenestrados do sinistro prédio encravado no bairro de Retiro, no coração da metrópole portenha. Hoje os argentinos respeitam sua corte suprema, reverenciam os seus juízes, não conhecem mais histórias escabrosas envolvendo os homens que representam a justiça de seu país.
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Nós, de Pindorama, ao contrário, estamos acordando para um pesadelo. Começamos a ver que a suspicácia não se circunscreve somente ao legislativo, com figuras lastimáveis como a do podre Severino Cavalcanti, do fedorento José Borba, dos petistas promíscuos do mensalão, do insepulto cubano Zé Dirceu, da figura abjeta do “Bispo” Rodrigues. Esses já foram condenados pela opinião pública. E não me venham dizer que a opinião pública está errada. Não! Não há santinhos ou beatos nessa história. Os que foram pegos pelo redemoinho da crise desatada pelo insaciável Roberto Jefferson são todos do mesmo naipe, uns-mais-outros-menos, mas todos da mesma tribo e da mesma taba. Nosso pasmo se estende, também, ao judiciário. E isso é muito pior. Desgraçado de um país com um judiciário desmoralizado e com juízes em quem ninguém confia ou respeita.
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O político Nélson Jobim foi quem começou essa história nada edificante. Foi ele, foi ele, sim, quem primeiro rasgou a toga e deixou à mostra as intimidades que ninguém queria ver: envolvimento político, clara advocacia de interesses, cabala de votos, intromissão nos outros poderes, partidarização de suas atividades, votos estarrecedores, concessões de hábeas-corpus a Delúbio Soares e Marcos Valério, afrontas constantes à cidadania. Caiu de majestade o ex-sócio de Eliseu Padilha, amigo de José Serra e de José Dirceu, aliado de FHC e do cumpanheiro Lulla, candidato a cargo eletivo nas próximas eleições, a mais controvertida e polêmica figura que já passou pelo STF.
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Agora o mineiro Carlos Mário Velloso, uma das melhores figuras do STF, um brasileiro da melhor qualidade, resolve nos escandalizar com decisão absolutamente ilegal. Pisoteando norma do próprio tribunal ao qual pertence, não dando bola para a Súmula Vinculante, desconhecendo o histórico do processo que levou Paulo e Flávio Maluf ao xilindró, o ministro resolveu mostrar o seu lado paternal, de mineiro afetuoso e, penalizado, ressaltou o sofrimento de um pai que divide uma cela precária com o próprio filho. Humanista de fancaria, como se vivesse em outro país ou habitasse planeta distante, nos confins da Via Láctea, o conspícuo magistrado soltou a dupla de larápios que desviou dos cofres públicos de São Paulo um montante que pode passar de US$ 1 bilhão. Concedeu, com a caridade de uma Irmã Dulce e a superioridade de um Mahatma Gandhi, a liberdade a dois ladrões que roubaram milhares de salas de aula que não foram construídas, centenas de quilômetros de ruas e avenidas que não foram pavimentadas, incontáveis leitos, postos de saúde ou hospitais que não saíram das pranchetas, milhares de toneladas de merenda escolar que não mataram a fome de estudantes carentes, de salários de professores e servidores municipais que não foram pagos, de milhares de empregos que não foram gerados. A piedade cristã desse magistrado respeitável assegurou a liberdade a dois sujeitos cuja honradez corresponde a quatro toneladas de documentos incriminatórios enviados pela justiça da Suíça ao Ministério Público de São Paulo. Os nobres sentimentos do ministro Velloso não podem se sobrepor às 600 horas de gravações telefônicas, ordenadas pela própria justiça e realizadas pela Polícia Federal, onde pai e filho protagonizam diálogos que fariam Al Capone e seus lugar-tenentes corarem de sincero pejo.
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Fiquei surpreendido com o ministro Velloso. Tenho por ele um respeito sincero, uma reverência absoluta. E ele sempre fez por merecer esse tratamento. Mas ao contrário de nosso (dele e meu) conterrâneo Carlos Drummond de Andrade, que nos mandava destapar os fracos de colônia e abafar o mau cheiro insuportável da memória, resolvi fazer o oposto. Fechei os frascos. Fechei com força, com decisão, não querendo o cheiro bom da água de colônia. Fui recordar os fatos e remexer na memória. Lembrei-me do aniversário de um colunista de Belo Horizonte, onde circulavam lobistas, doleiros, políticos, socialites e deslumbrados. Lá, simpático e bonachão, estava o Ministro Carlos Mário Velloso, meio deslocado num canto do salão. Aproximei-me, falei de amigos comuns e batemos um longo papo pelo resto da noite. Não me engano: é um homem da melhor qualidade moral, além de um magistrado que sempre expendeu votos que dignificam sua já longa carreira na magistratura. Fiquei preocupado com essa decisão do Ministro Velloso: já é uma metástase do estilo jobiniano: um ministro decentíssimo do STF libertar dois assaltantes movido por “piedade”...
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Não quero um Supremo Tribunal no qual não confie. Não quero que ao lado de um Celso de Mello ou de um Marco Aurélio, de um Gilmar Mendes ou de um Ayres de Britto, ou de qualquer um dos outros ministros que não tem vestido a toga pelo avesso, se sentem magistrados que julguem por sentimentos paternais, ligações partidárias ou posturas que gerem comentários impublicáveis. Não aceito como cidadão. Tenho esse direito. Os brasileiros tem o direito de exigir que o STF se dê ao respeito. A coisa chegou a um ponto tão absurdo, tão lastimável, tão escandaloso, que um ministro vota contra a vontade do Dr. Jobim e ele ataca verbalmente o colega, obrigando outro a socorrer o primeiro pedindo que “não baixe a guarda, ministro”. E o Dr. Jobim, diz que o voto do colega é “udenista” e lembra que “foi a UDN que levou Getúlio ao suicídio”. Desmemoriado esse Nélson Jobim! Recomendo-lhe que se recorde de que foi ministro de Fernando Henrique e dele ganhou sua vaga no Supremo, e tal governo vivia cantando em verso e prosa “o fim da era Vargas”. Não sabia que o distinto era getulista. Que interessante... Se for à biblioteca do Supremo e se der ao trabalho de ler nosso maior historiador, o saudoso Hélio Silva, vai saber que seu avô, então governador do Rio Grande do Sul, conspirou tanto contra Vargas quanto qualquer das vestais paridas da UDN. Por trás, já que pela frente disputava espaço no palanque e atenção do velho até com Gregório Fortunato.
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Vamos limpar o STF. Seus ministros não estão acima do bem e do mal. Quero respeitar, quero amar, quero reverenciar a suprema corte de meu país. Quero abaixar minha cabeça para suas decisões. Quero não duvidar da honorabilidade de seus veredictos. Quero poder defender seus integrantes. Não quero saber de história nenhuma sobre qualquer um deles que não seja elogiosa. Não quero que pairem dúvidas, nem se ouçam críticas, nem que se duvide do saber jurídico de seus ministros. Não quero que se diga nada sobre suas condutas, a não ser que são absolutamente ilibadas. I-li-ba-das. Não quero saber que qualquer ministro voou em jatinho de banqueiro, nem se hospedou em hotel por conta de partido político, nem se sentou em mesa de lobista em restaurante da moda, nem tem processo de banco dormitando em gaveta alguma.
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Não me podem negar o direito de querem bem o Supremo Tribunal de meu país. Se assim o fizerem, lamento informar que – mesmo não sendo masoquista – terei até orgulho em ser condenado por um tribunal que solta Maluf e seu filhote e garante prévia impunidade a ladrões que vão depor em Comissões Parlamentares de Inquérito. Nunca o STF esteve na berlinda como agora. Algo há que ser feito. É preciso, urgentemente, promover a responsabilização penal e política, através do Congresso Nacional como representação maior da sociedade civil, do Ministro Nélson Jobim. Juiz não é divindade, toga não é sudário.
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ruynogueira@uol.com.br
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“Já que o mundo fez de mim uma prostituta,
irei transformar o mundo num grande bordel”
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Clara Zachanassian,
in “A visita da velha senhora”,
de Friederich Dürrenmatt
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Na primeira das quatro vezes em que visitei Lima, a cinzenta e úmida capital dos peruanos, avistei pela janela do hotel Sheraton um edifício imponente, do lado oposto do largo e caótico Paseo de la República. Uma construção antiga, imponente, bonita, lembrando um pouco o demolido Palácio Monroe, na Cinelândia, onde funcionou o Senado da República nos tempos do Rio Capital Federal. No táxi indaguei sobre o mastodonte. “És el palácio de la injusticia”, esclareceu-me o velho motorista, com traços indígenas, ar irônico e riso triste. Comecei a compreender ali, naquele preciso instante, a fabulosa popularidade que o ditador Alberto Fujimori gozava entre as camadas mais humildes da população. Meses antes, a suprema corte peruana havia passado por uma limpeza exemplar, com aposentadorias compulsórias, expulsões sumárias ou simples execrações de magistrados que se julgavam acima do bem e do mal. Os peruanos odiavam sua justiça. Os claros favorecimentos, as comentadas compras de sentenças, as negociatas quase públicas, as vendas de proteção, os engavetamentos ad aeternum, os escritórios de advocacia que garantiam as sentenças previamente compradas, os filhos que advogavam na corte onde os pais eram juízes, os ex-sócios e suas intimidades com as maçanetas dos gabinetes, os escandalosos acertos com o sistema financeiro, a adesão sistemática aos governos, a desenvoltura política dos juízes e o impressionante descrédito perante os peruanos formaram o grosso caldo de cultura que propiciou uma faxina geral no poder judiciário local. Esse mérito Fujimori tem: deu aos peruanos uma justiça na qual, ainda hoje, acreditam bem mais que antes.
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O gatuno Carlos Menem foi nomeando juízes para a Corte Suprema da Argentina à sua imagem e semelhança. Cada qual pior que o outro. Gente de quinta categoria. Lembro-me da imagem de um deles, um cáften típico, com direito a anelão, cabeleira pintada de um negro brilhoso, indecente, tipo asa da graúna, com cara de picareta, com jeito de picareta, com ademanes de picareta. Picareta, portanto. Nada na Argentina escandalizou tanto, chocou tanto, afrontou tanto quanto aqueles provectos picaretas que garantiram ao gatuno de La Rioja uma tranqüila maioria na última instância do judiciário local. E põe última nisso... Nestor Kirchner - homem corajoso e decidido, ao contrário de seu colega brasileiro – moveu campanha memorável contra os juízes menemistas. Os atacou publicamente pelas TVs, no Congresso, em discurso na Casa Rosada, citando os nomes, esculhambando-os de forma implacável. Não deu outra: alguns se aposentaram rapidinho, outros enfrentaram “juícios políticos” no parlamento, respondendo por seus crimes e sendo defenestrados do sinistro prédio encravado no bairro de Retiro, no coração da metrópole portenha. Hoje os argentinos respeitam sua corte suprema, reverenciam os seus juízes, não conhecem mais histórias escabrosas envolvendo os homens que representam a justiça de seu país.
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Nós, de Pindorama, ao contrário, estamos acordando para um pesadelo. Começamos a ver que a suspicácia não se circunscreve somente ao legislativo, com figuras lastimáveis como a do podre Severino Cavalcanti, do fedorento José Borba, dos petistas promíscuos do mensalão, do insepulto cubano Zé Dirceu, da figura abjeta do “Bispo” Rodrigues. Esses já foram condenados pela opinião pública. E não me venham dizer que a opinião pública está errada. Não! Não há santinhos ou beatos nessa história. Os que foram pegos pelo redemoinho da crise desatada pelo insaciável Roberto Jefferson são todos do mesmo naipe, uns-mais-outros-menos, mas todos da mesma tribo e da mesma taba. Nosso pasmo se estende, também, ao judiciário. E isso é muito pior. Desgraçado de um país com um judiciário desmoralizado e com juízes em quem ninguém confia ou respeita.
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O político Nélson Jobim foi quem começou essa história nada edificante. Foi ele, foi ele, sim, quem primeiro rasgou a toga e deixou à mostra as intimidades que ninguém queria ver: envolvimento político, clara advocacia de interesses, cabala de votos, intromissão nos outros poderes, partidarização de suas atividades, votos estarrecedores, concessões de hábeas-corpus a Delúbio Soares e Marcos Valério, afrontas constantes à cidadania. Caiu de majestade o ex-sócio de Eliseu Padilha, amigo de José Serra e de José Dirceu, aliado de FHC e do cumpanheiro Lulla, candidato a cargo eletivo nas próximas eleições, a mais controvertida e polêmica figura que já passou pelo STF.
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Agora o mineiro Carlos Mário Velloso, uma das melhores figuras do STF, um brasileiro da melhor qualidade, resolve nos escandalizar com decisão absolutamente ilegal. Pisoteando norma do próprio tribunal ao qual pertence, não dando bola para a Súmula Vinculante, desconhecendo o histórico do processo que levou Paulo e Flávio Maluf ao xilindró, o ministro resolveu mostrar o seu lado paternal, de mineiro afetuoso e, penalizado, ressaltou o sofrimento de um pai que divide uma cela precária com o próprio filho. Humanista de fancaria, como se vivesse em outro país ou habitasse planeta distante, nos confins da Via Láctea, o conspícuo magistrado soltou a dupla de larápios que desviou dos cofres públicos de São Paulo um montante que pode passar de US$ 1 bilhão. Concedeu, com a caridade de uma Irmã Dulce e a superioridade de um Mahatma Gandhi, a liberdade a dois ladrões que roubaram milhares de salas de aula que não foram construídas, centenas de quilômetros de ruas e avenidas que não foram pavimentadas, incontáveis leitos, postos de saúde ou hospitais que não saíram das pranchetas, milhares de toneladas de merenda escolar que não mataram a fome de estudantes carentes, de salários de professores e servidores municipais que não foram pagos, de milhares de empregos que não foram gerados. A piedade cristã desse magistrado respeitável assegurou a liberdade a dois sujeitos cuja honradez corresponde a quatro toneladas de documentos incriminatórios enviados pela justiça da Suíça ao Ministério Público de São Paulo. Os nobres sentimentos do ministro Velloso não podem se sobrepor às 600 horas de gravações telefônicas, ordenadas pela própria justiça e realizadas pela Polícia Federal, onde pai e filho protagonizam diálogos que fariam Al Capone e seus lugar-tenentes corarem de sincero pejo.
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Fiquei surpreendido com o ministro Velloso. Tenho por ele um respeito sincero, uma reverência absoluta. E ele sempre fez por merecer esse tratamento. Mas ao contrário de nosso (dele e meu) conterrâneo Carlos Drummond de Andrade, que nos mandava destapar os fracos de colônia e abafar o mau cheiro insuportável da memória, resolvi fazer o oposto. Fechei os frascos. Fechei com força, com decisão, não querendo o cheiro bom da água de colônia. Fui recordar os fatos e remexer na memória. Lembrei-me do aniversário de um colunista de Belo Horizonte, onde circulavam lobistas, doleiros, políticos, socialites e deslumbrados. Lá, simpático e bonachão, estava o Ministro Carlos Mário Velloso, meio deslocado num canto do salão. Aproximei-me, falei de amigos comuns e batemos um longo papo pelo resto da noite. Não me engano: é um homem da melhor qualidade moral, além de um magistrado que sempre expendeu votos que dignificam sua já longa carreira na magistratura. Fiquei preocupado com essa decisão do Ministro Velloso: já é uma metástase do estilo jobiniano: um ministro decentíssimo do STF libertar dois assaltantes movido por “piedade”...
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Não quero um Supremo Tribunal no qual não confie. Não quero que ao lado de um Celso de Mello ou de um Marco Aurélio, de um Gilmar Mendes ou de um Ayres de Britto, ou de qualquer um dos outros ministros que não tem vestido a toga pelo avesso, se sentem magistrados que julguem por sentimentos paternais, ligações partidárias ou posturas que gerem comentários impublicáveis. Não aceito como cidadão. Tenho esse direito. Os brasileiros tem o direito de exigir que o STF se dê ao respeito. A coisa chegou a um ponto tão absurdo, tão lastimável, tão escandaloso, que um ministro vota contra a vontade do Dr. Jobim e ele ataca verbalmente o colega, obrigando outro a socorrer o primeiro pedindo que “não baixe a guarda, ministro”. E o Dr. Jobim, diz que o voto do colega é “udenista” e lembra que “foi a UDN que levou Getúlio ao suicídio”. Desmemoriado esse Nélson Jobim! Recomendo-lhe que se recorde de que foi ministro de Fernando Henrique e dele ganhou sua vaga no Supremo, e tal governo vivia cantando em verso e prosa “o fim da era Vargas”. Não sabia que o distinto era getulista. Que interessante... Se for à biblioteca do Supremo e se der ao trabalho de ler nosso maior historiador, o saudoso Hélio Silva, vai saber que seu avô, então governador do Rio Grande do Sul, conspirou tanto contra Vargas quanto qualquer das vestais paridas da UDN. Por trás, já que pela frente disputava espaço no palanque e atenção do velho até com Gregório Fortunato.
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Vamos limpar o STF. Seus ministros não estão acima do bem e do mal. Quero respeitar, quero amar, quero reverenciar a suprema corte de meu país. Quero abaixar minha cabeça para suas decisões. Quero não duvidar da honorabilidade de seus veredictos. Quero poder defender seus integrantes. Não quero saber de história nenhuma sobre qualquer um deles que não seja elogiosa. Não quero que pairem dúvidas, nem se ouçam críticas, nem que se duvide do saber jurídico de seus ministros. Não quero que se diga nada sobre suas condutas, a não ser que são absolutamente ilibadas. I-li-ba-das. Não quero saber que qualquer ministro voou em jatinho de banqueiro, nem se hospedou em hotel por conta de partido político, nem se sentou em mesa de lobista em restaurante da moda, nem tem processo de banco dormitando em gaveta alguma.
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Não me podem negar o direito de querem bem o Supremo Tribunal de meu país. Se assim o fizerem, lamento informar que – mesmo não sendo masoquista – terei até orgulho em ser condenado por um tribunal que solta Maluf e seu filhote e garante prévia impunidade a ladrões que vão depor em Comissões Parlamentares de Inquérito. Nunca o STF esteve na berlinda como agora. Algo há que ser feito. É preciso, urgentemente, promover a responsabilização penal e política, através do Congresso Nacional como representação maior da sociedade civil, do Ministro Nélson Jobim. Juiz não é divindade, toga não é sudário.
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